Há um texto nas Escrituras que nos deixa maravilhados. É o capítulo 25
de 1º Crônicas, que registra a organização e a atividade específica de um grupo de
levitas que se dedicava exclusivamente à música. O versículo 6 resume a beleza
daquele quadro, quando afirma que
todos os músicos e cantores estavam sob a direção respectiva de seus
pais Asafe, Hemã e Jedutum e estes sob as ordens do rei Davi. Que
segredo havia naquelas famílias, para conseguir aquela submissão espontânea,
pois que da qual se exigia harmonia e dedicação? E não há dúvida de que todos
estavam em comunhão íntima com Deus, a ponto de profetizarem com harpas (v.3),
terem visões espirituais (v.5), estarem aprovados e serem constituídos alvos de
promessas especiais de Deus. O grau de harmonia entre aquele grupo era tão
grande, que se consideravam iguais entre si, a ponto de se submeterem todos a
um sorteio comum para lhes designar os deveres (v. 8), independentemente de
hierarquia, antiguidade ou privilégios especiais.
A explicação para esse exemplo tão tocante está
no v. 8: o tipo de relacionamento que cultivavam – O DISCIPULADO. Mestre
e discípulo eram iguais nos deveres, mas respeitosos na
submissão (v.6). Estes dois pontos caracterizam princípios para todos
os cristãos em sua relação no corpo de Cristo e atividade espiritual.
O DISCIPULADO é, pois, um tipo de
relacionamento que gera uma submissão espiritual desejável. Davi era o
chefe daquele grupo que se compunha de 288 músicos. Certamente não por ser rei,
mas pelas suas qualidades. A submissão do discípulo ao seu mestre não se dá
numa base formal, como se na obra de Deus alguém pudesse ser nomeado mestre por
um decreto ou portaria, ou mesmo eleição. Antes, porém, se baseia na
autoridade espiritual do mestre e no reconhecimento dessa autoridade por parte
do discípulo.
A ligação mestre - discípulo se baseia na diferença
de espiritualidade entre um e outro. O mestre ou discipulador é uma
pessoa que aprendeu antes, passou por todas as etapas do aprendizado e tem amor
pela obra de Deus, a ponto de conseguir fazer discípulos e se dar por
eles. Por isso se estabelece (formal ou informalmente) um
compromisso de aliança entre ambos. O discípulo se submete ao mestre.
Apesar da autoridade espiritual, o
mestre não se sente no direito de "mandar" no discípulo, como que
querendo controlar a vida dele. No culto, na atividade espiritual, o
mestre serve junto com o discípulo. São todos iguais. Ele trabalha também. É
como o que fizeram todos os príncipes na reconstrução dos muros de Jerusalém
com Neemias.
A vida e o ministério de Jesus sobre a terra
foram um exemplo insofismável do discipulado, bem como o método ou a forma de
trabalho do apóstolo Paulo. O escritor Robert E. Coleman, em seu livro
intitulado em Português “O PLANO MESTRE DE EVANGELISMO”, analisa com extrema
felicidade o ministério terreno do Senhor e estabelece os 8 princípios do discipulado
cristão, o que deveria merecer a atenção de todo cristão sério, bem como de
todo líder evangélico. São eles: SELEÇÃO, ASSOCIAÇÃO, TRANSMISSÃO,
DEMONSTRAÇÃO, DELEGAÇÃO, SUPERVISÃO e REPRODUÇÃO.
Ao partir, o Senhor deixou-nos a ordem clara: “
Ide por todo o mundo e fazei discípulos...” O IDE é
inseparável do FAZER DISCÍPULOS. É impossível fazer discípulos
sem ir (como que esperando por eles- e há muita gente nas igrejas assim), como
é inútil ir pregar sem uma condição mínima para discipular, ou consolidar os
resultados alcançados. Seria como que semear apenas à beira do caminho,
esperando que Satanás não roube a semente lançada e ela germine sozinha (assim
só mato). Ou como continuar pescando em alto mar, com o barco a pique,
sem condições de trazer os peixes.
O fazer discípulos é, pois, em primeiro lugar,
a ordem máxima do cristianismo. É a missão principal do cristão, à qual
todo cristão deve se dedicar, para não ser uma pessoa estéril.
Ocorre, porém, em nossos dias, uma confusão
perigosa entre o IDE e o VINDE. Parece que a
tendência geral entre os cristãos mais sinceros é de enviar obreiros para
pregar aos incrédulos, para depois trazê-los (para a sua Igreja). A atitude
atual parece ser, pois: “ide, e depois vinde”; como se não se
cresse no poder do Senhor, para dizer: “ide, ficai, crescei,
multiplicai-vos.”
Novamente em Israel encontramos esclarecimentos
adicionais sobre este assunto. Foi o próprio Senhor quem ordenou aos filhos de
Israel que viessem todos ao templo três vezes por ano (Êxodo 34.23). Quando no
deserto os israelitas se acampavam, cada um deveria fazê-lo, não no lugar que
achasse melhor, mas cada um sob o seu respectivo estandarte, e todos ao redor
da tenda da congregação. Cada tribo (cada grupo) com seu príncipe, segundo sua
família, a casa de seu pai (Nm 2.2). Isso era necessário para que houvesse
ordem entre todo aquele grande povo. O discipulado tem uma de suas
finalidades no arregimentar um grande número de pessoas, guardando uma necessária
unidade de ação. Este ideal é praticamente impossível de ser
alcançado com uma liderança fraca ou um governo frouxo e destituído de
discipulado.
Os príncipes (os homens principais) de cada
tribo desempenhavam um papel muito importante no governo civil em Israel, mas
não no culto a Deus. Cada príncipe era o filho mais velho do príncipe anterior
e, sendo assim, em questão de ordem, todos da tribo lhe deviam
obediência. Isto é a área de governo da igreja, visando ordem no povo (para
que haja progresso). Mas no culto todos eram iguais. E
os sacerdotes, que ofereciam os sacrifícios, eram servos de todos. Deus
atenderia a todos e a cada um que tivesse o coração sincero e O buscasse em
espírito e em verdade, como adoradores verdadeiros.
Em Números 10 se estabelece a instituição das
trombetas, que deveriam ser tocadas pelos sacerdotes. Elas eram o meio de
comunicação rápida entre os líderes e o seu povo, fator de arregimentação. Os
toques das trombetas se dirigiam ora só aos príncipes (v. 4), ora a toda a
congregação (v.3). Tocavam na guerra (v.9) e nas
festas (v.10). Ao tocarem, todos osdiscípulos deveriam
dirigir-se aos respectivos “mestres” ou chefes. E assim todo o povo atenderia a
uma só ordem. Povo de convocação. Que maravilha! Ficamos admirados.
Nas passagens acima percebemos claramente duas
tendências: a centralização e a descentralização.
A
organização da Igreja inclui esses dois movimentos distintos, reconhecidos em
suas respectivas áreas. O governo eficiente e participativo exige a
descentralização. E para tanto, nada melhor do que o discipulado.
Mas o culto a Deus e a unidade de ação dependem fundamentalmente da
centralização de decisões e de orientação específica. Da mesma
maneira, nada melhor do que o discipulado, que é a única forma possível de
garantir a obediência às ordens divinas, havendo a necessária descentralização,
para o governo eficiente.
Podemos, portanto, afirmar que a
vontade de Deus na Igreja é a centralização para o culto e a descentralização
no governo e na ação.
O QUE É DISCIPULADO
Para Moisés, o conselho do sogro, de escolher
anciãos que com ele dividissem a responsabilidade sobre o povo (Êxodo 18.
21-26), teve o respaldo divino (Números 11.16), de forma que entendemos ser a
delegação de responsabilidades bem vista aos olhos de Deus. O próprio governo
do Rei Jesus sobre a terra no milênio adotará esse tipo de organização, quando
uns receberão autoridade sobre 5 cidades, outros sobre 10 e assim por diante (Lc
19. 17-19). Quanto a Israel, a organização do povo era bem clara (Dt 1. 13-15).
Havia chefes de 1000, de 100, de 50, e de 10. Os príncipes de cada tribo eram
os chefes de seus milhares. Não há dúvida de que o chefe de 50 tinha autoridade
sobre 5 chefes de 10, em geral de sua família. Dessa forma as ordens de Deus
aos líderes eram facilmente cumpridas por todos. Essa organização era bem
tipicamente militar. Presumia a hierarquia e a disciplina. Qualquer
rebelião contra os chefes de família era ensejo para aplicação da lei marcial
(a morte). Assim, os chefes eram obedecidos rigorosamente. E nada menos que
isso poderia ser tolerado se, se quisesse manter firme a unidade de comando em
todo o Israel. O próprio Deus aprovava essa organização militar. Ele se
auto-intitulava muitas vezes de “Senhor dos Exércitos”.
O discipulado, como opção de organização se
opõe à democracia, na qual todos têm, perante a lei,
igual direito de opinar sobre as decisões gerais. No discipulado as ordens vêm
de cima. Na democracia as determinações provêm da maioria. Quem quiser, no
sistema democrático, ter autoridade, deve fazer suas idéias conhecidas e
influenciar o povo a apoiá-las. E com base nesse apoio recebido tomar as
deliberações cabíveis. Os líderes em Israel Coré , Datã e Abirã não se
conformaram com o sistema de governo, nem com a liderança de Moisés e quiseram
mudá-los via método democrático (Nm 16). Organizaram a "Revolta
Democrática" contra Moisés e Arão (mais tarde foram imitados por Absalão).
Arregimentaram o povo, que com eles concordava e partiram para a ação. O
resultado que colheram foi o juízo fatal de Deus.
No discipulado parte-se do princípio de
que as ordens vêm de Deus, através dos presbíteros (líderes), que são
constituídos em autoridade máxima na localidade. Cada um deles repassa a
orientação aos discípulos sob sua influência. E assim por diante, até que todo
o povo tome conhecimento e obedeça às ordens recebidas. Não há lugar para
discutir a validade das ordens. É possível discutir-se a forma de sua melhor
aplicação, mas nunca a conveniência de seu cumprimento. Ordens se cumpre. À
semelhança de Coré, Datã e Abirã, seria isso uma afronta a Deus e aos seus
ungidos.
A diferença básica entre o regime militar ou a
organização israelita, e o discipulado cristão é que, naqueles sistemas os
chefes são designados, nomeados ou estabelecidos, enquanto no discipulado o
discípulo se submete espontaneamente ao seu mestre, pelo reconhecimento nele da
autoridade divina. E o mestre se faz tal pelas suas qualidades espirituais, bem
como pelo fruto da sua vida, no que é reconhecido pelo discípulo. E
assim, no discipulado não há tensões, ou motivos para rebelião e insatisfação.
Qualquer incompreensão que haja é explicada por quem tem autoridade e assim
facilmente compreendida. Em caso de disciplina ela é aplicada com amor, podendo
alcançar resultados positivos.
O discipulado permite ainda o melhor
conhecimento das necessidades dos santos, bem como uma mais
equilibrada divisão do trabalho na comunidade. O resultado total é
o maior proveito por parte de todos, bem como uma maior potência evangelística
e missionária na Igreja.
http://www.blogdopastorerico.com/2017/10/discipulado-e-ordem-de-deus.html
Nenhum comentário:
Postar um comentário